segunda-feira, 28 de maio de 2007

Josiel, meu mestre

Vocês podem até não torcer pelo Paraná Clube. Afinal, ninguém é perfeito. Ainda assim não ignoram o menino Josiel, que tem trazido alegrias infindas a nós outros, felizes paranistas. O gênio de Josiel não está só no pé, que é de ouro. Seu gênio vem também de uma sabedoria milenar. Sintam como o menino explicou a superação de suas dificuldades no jogo de ontem: "Se não dá na habilidade e no toque de bola, tem que usar a força-de-vontade". Se o Guimarães Rosa já não estivesse ao lado desta tela, lá estaria o Josiel - que estará sempre no imenso coração paranista.

Explicações de Renan Calheiros

Acabo de assistir a fala de Renan Calheiros no Senado, explicando o imbróglio pensão alimentícia - supostamente despesa paga pela Construtora Mendes Júnior. Correto, separando as questões. Uma delas, sua vida pessoal e familiar, intangível como deve ser. Outra, bem diferente, relações dele como senador e empreiteiras. Esta deve ser investigada, no momento e pelos meios próprios. Seja como for, foi um divisor de águas na política brasileira. Pela primeira vez, ao que sei, a vida do político - mesmo no campo privado - passou a ser pública. Ainda precisa ser amadurecida a análise. Mas vimos aqui algo parecido com o que acontece nos EUA nessas situações: o homem público se expõe, explica. E pede perdão. Só quanto ao pedir perdão é que sempre tive dúvidas, pois é o arrependimento que vem tarde.

Quem nunca viu não sabe...

Domingo de sol, a arquiteta, linda, rica, solteira, naquela idade esplêndida imortalizada na música de Nelson Gonçalves - também talentosa (ganhou prêmio em Paris) – vai caminhar no parque, digo, no Bosque Português, ali no Jardim Social. "Perto de casa", diz ela justificando a má escolha. Sei de experiência: o cheiro de esgoto é pior que na assembléia legislativa, o pavimento é impróprio e o trecho é curto; salvam-se os poemas naqueles marcos de concreto, que nosso Greca selecionou pessoalmente quando prefeito. Sózinha – onde estão os homens livres deste planeta? – chega ao fim da pista e do meio do mato sai um desses motoqueiros folgados. Muito folgado, tão folgado que, imperturbável, continuou brandindo a estrovenga, naquele característico ato de sacudir. O folgado, sempre folgado, nem se abala. E você? perguntei à linda arquiteta. "Quem nunca viu não sabe o que é. Quem já conhece não se assusta", diz-me a moça. Viva Mussum, sábio e trapalhão.

Precatórios & impostos. Livre pensar é só pensar

A Gazeta do Povo de ontem tem reportagem, com prós e contras, sobre o pagamento de impostos com precatórios, dívida do contribuinte com o Estado sendo quitada com dívida do Estado. Há quatro anos o Estado vinha aceitando a negociação, que bloqueou agora em janeiro. O mercado de precatórios floresceu, com as espertezas de dentro e de fora. De fora, o deságio brutal dos intermediários: compravam com desconto de até 80% sobre o valor da dívida do Estado, vendiam pelo dobro ao contribuinte-devedor, que quitava seu imposto pelo valor total do precatório. As espertezas de dentro, tem gente de dentro vendo. Ou não. Na lógica boa e saudável, todo argumento tem que ser examinado a fundo, senão a burrice impera – nosso "grande patrimônio nacional", como dizia Roberto Campos.
· O titular do precatório é explorado pelo intermediário. Mas não é obrigado a vender. Se vende, submeta-se ao mercado.
· O Estado sai perdendo, porque quita pelo total aquilo que foi pago por menos de um terço. Afinal, pretende-se proteger o Estado ou o dono do precatório? E quem realmente está enganando quem? – O intermediário, o contribuinte, o titular do precatório, todos agindo de acordo com suas vontades e interesses, ou o Estado, que usa o poder para retardar pagamentos?
· O Estado teve queda na arrecadação, por isso parou de aceitar precatórios como pagamento. Aqui só a anestesia ética justifica o argumento. Ou o Estado nunca aceita, ficando no lé com cré, imposto é imposto, precatório é precatório, ou não tem base ética para eliminar uma facilidade que tinha criado. Faltou à Gazeta avançar nesta direção: houve mesmo queda na arrecadação? Mudou o quadro econômico a ponto de reduzir a receita?
· Se a preocupação é com o recebimento integral do imposto, como se explicam as leis de anistia e refinanciamento – que invariavelmente são aprovadas a cada quatro anos, nas vésperas das eleições? O contribuinte que paga em dia o imposto integral vê o mau contribuinte pagando uma ninharia, e em longo parcelamento. Que receita integral é essa? Que paranista compensação é essa?
· E já que falamos de flores, o que dizer das dívidas sob precatórios? Não tem aí nenhum viés ético a explorar, nisso de o Estado criar situações para gerar as dívidas? Que no geral são resultado da falta de controle, da omissão, da própria falta de responsabilidade, por que não dizer?

Croquetas & maletines. De oro

Croquetes de ouro, como os paraguaios passaram a chamar o serviço de lanche da parte deles na Itaipu. Está no ABCdigital, de Assunção, a matéria sobre o processo judicial de cobrança. Rola desde 2001 e já atinge a bagatela de 30 milhões de dólares. Não bastasse isso, um diretor de lá sacou na semana passada 4 milhões que estavam depositados em garantia na Justiça – e nem disse o que vai fazer com a grana.

Só no Paraguai, aqui não tem disso, não. No tempo de don Girolamo Scalco na presidência surgiram os maletines de oro, as pastas/maletas distribuídas como brindes. Scalco ficou cabreiro e marcou reunião: ele, o diretor paraguaio e o embaixador brasileiro, o nosso Bernardo Pericás. As mesmas maletas custavam de 80 até 180 dólares, no mesmo fornecedor. A explicação paraguaia não convenceu, até que Pericás sacou em tom de piada: "as maletas são iguais, mas depende do que vem dentro".

Ônibus, leis & salsichas

O chanceler Bismarck dizia que "se o povo alemão soubesse como são feitas as leis e as salsichas perderia o sono". Sobre salsichas aprendi criança, no Açougue Tomacheski, em Triunfo (são ótimas e confiáveis). Sobre leis aprendi tarde, com o bravo Wagner Pacheco, um dos melhores procuradores gerais que o Paraná teve, lá em outubro de 1989. A assembléia do Paraná acabava de votar a constituição – relator Caito Quintana - e Álvaro Dias estava encucado com o § 3º. da parte permanente, fazia eternas as concessões das empresas de transporte coletivo interestadual (transcrevo 1, lá embaixo). Fomos ao Supremo e suspendemos o artigo da constituição, menos de um mês da entrada em vigor. Logo em seguida Wagner, Maurício Ferrante e eu fizemos até um anteprojeto da lei de transporte, que tomou chá de sumiço na assembléia. Como no poema de Drummond, tinha um sofá no meio do caminho – veio a emenda 3 e a assembléia queimou o sofá: fez desaparecer o parágrafo das concessões eternas (a emenda também desapareceu do site da assembléia). Passa o tempo, concessões sempre prorrogadas e a assembléia aprova a lei complementar 94, em 23 de julho de 2002; nasce a agência reguladora dos serviços públicos de infraestrutura. Esta ficou na casca, porque o governador Requião nem deu bola, ele estava no auge da paixão por Hegel(nada entre o povo e o Estado). Requião não gostou mesmo foi da lei complementar que a assembléia votou em seguida, a número 95, de 9 de setembro. Tinha só um artigo (transcrevo 2), que prorrogava as concessões até 2010. Sergio Botto – durão que nem o Wagner –, anulou a lei no Supremo em setembro do ano passado. Dizia o Wagner na época sobre a constituição do Paraná, "esse artigo surgiu na madrugada". Foi aí que começou minha insônia. Nosso DER fez alguma coisa desde setembro? Não fez nada. Mas entrou outro durão na parada, e deste ninguém tira o cargo e a teimosia: Sérgio Cruz Arenhardt, procurador da República, que tascou uma ação civil pública em cima das empresas de transporte.

TRANSCRIÇÕES
1) § 3º. do art. 146 da constituição do Paraná: Às empresas que já prestaram com tradição serviço de transporte coletivo de passageiros, por ato delegatório de qualquer natureza, expedido pelo Estado do Paraná, e com prazo de vigência vencido ou por vencer, fica assegurado o direito de dar continuidade aos mesmos serviços que vinha prestando, mediante prorrogações ou renovações das respectivas delegações, observados os incisos do §1º. deste artigo.
O absurdo é que puseram isso na parte permanente, não na parte transitória, onde caberia na melhor e mais paranista das hipóteses. Ou seja, veio tipo cláusula pétrea, como dizem os advogados. Além de absurdo, o texto tem no texto o DNA de advogado cercando um contrato, não de artigo de lei.
2) O único artigo da lei complementar 95, de 9 de setembro de 2002
Art. 43. As empresas que, na data da instalação da AGÊNCIA, detentoras de outorgas vencidas e/ou com caráter precário ou que estiver em vigor com prazo indeterminado, terão as mesmas mantidas, sem caráter de exclusividade, pelo prazo previsto no art. 98 do Decreto Federal n.º 2.521, de 20 de março de 1998, em atendimento ao disposto no art. 42, § 2º, da Lei Federal 8987, de 13 de fevereiro de 1995, e adaptados aos princípios norteadores da AGÊNCIA.
Não há problema nenhum com lei de único artigo, mas neste ônibus tinha fundo falso. Lei feita com pressa, o Requião apontando lá na curva, publicada quarenta e dois dias depois da lei complementar 94. Talvez o mesmo advogado de 1989 redigindo uma cláusula contratual segura e fechada. Com tanta pressa que até perpetrou aquele "...outorgas ...que estiver em vigor".
PS. Quanto à emenda 3 ou 7, que suprimiu o §3º.do art.142 fica o pedido para o presidente Nelson Justus mandar incluir no site de legislação da assembléia.